quarta-feira, 25 de julho de 2007

INDIGNAÇÃO DEMOCRÁTICA


por Sebastião Paixão Jr.


Creio que todos os cidadãos que se julguem probos e honestos estejam insatisfeitos com os desmandos da política. Acontece que nossa insatisfação é passiva e inerte. Objetivamente, não fazemos nada para mudar uma corrupção cada vez mais escancarada e ordinária. Os lacaios da política perderam todos os limites éticos; solapam abertamente o patrimônio público e, no seu íntimo, devem dar uma bela gargalhada daqueles que se atrevem a impugná-los. A extrema ousadia dos corruptos é respondida com uma conivência cândida por aqueles que se julgam de bem. Com isso, silenciosamente, aceitamos todos os abusos que ocorrem no país. E o mais grave: somos partícipes omissos dessas desventuras.A questão é que não queremos nos incomodar. Afinal, porque eu deixarei tranqüilidade do lar e da vida privada para comprar briga com poderosos profissionais da corrupção? Para que suportar pressões e eventuais ameaças sobre minha família? Por que, logo eu, terei que tomar a iniciativa se esse país está fadado ao martírio da desonestidade? Imaginar um Brasil honesto não seria coisa da ingenuidade juvenil? Enfim, é assim que pensamos.



Cremos que a situação é insolúvel, pois tudo parece estar corrompido. Enquanto isso, os lobos fazem a festa para o olhar passivo dos cordeiros.A nossa inação está nos matando. Entregamos, todo mês, 27,5% de nossa renda para um governo que sequer possui escolas decentes para nossas crianças; para um governo que sequer proporciona uma saúde pública mínima e eficaz; para um governo que oferece uma previdência pueril; para um governo que não consegue construir estradas e aeroportos com condições de dirigibilidade e segurança; para um governo que deixa nossas florestas serem devastadas à luz do sol; para um governo ineficiente e, pior, completamente omisso no combate da corrupção endêmica que se espalha por todos os quadrantes do setor público.


Ora, é no seu salário suado, contribuinte, que estão botando a mão e você ainda fica quieto?Somos uma democracia, mas não temos cultura democrática. Nossa apatia diante da escancarada desonestidade política revela nosso pouco apreço às instituições republicanas. O recente escândalo do Senado é paradigmático. A presidência da Alta Casa legislativa, que deveria ser sinônimo de austeridade e decência, vê-se envolvida em denúncias indecorosas de grosso calibre. E, ao invés da preservação do Senado da República com o afastamento do cargo até o final das investigações, prefere-se a manutenção das influências do cargo para fins de interesse pessoal. O Conselho de Ética, órgão responsável pela proteção do decoro e da dignidade legislativa, é outro retrato da desordem; de tantas idas e vindas, virou exemplo do descrédito parlamentar e da ética do faz-de-conta. Se isso não bastasse, vimos novamente a renúncia servir de válvula de escape.


Para um sistema que privilegia a impunidade reinante, a renúncia parlamentar não deixa de ser uma honrada forma covarde de dizer adeus sem a perda dos direitos políticos. E não é de se duvidar que, no próximo pleito, a saída pela porta de emergência seja premiada com o voto altista do eleitorado. Com isso, nossas instituições definham com uma assustadora conivência das urnas. A questão é: o que fazer?Ora, resta claro que o problema do Brasil não é a falta de dinheiro; recursos sobram até pelo ralo. O que nos falta é indignação democrática que faça e exija seriedade e decência daqueles que se querem políticos. A democracia não sobrevive sem a devida responsabilidade dos agentes públicos. E somos nós, cidadãos, que temos o ônus de cobrá-la. Estamos chegando a um momento limite da vida política brasileira: ou retomamos e fazemos valer as regras do sistema democrático-constitucional ou seremos tragados por um movimento político de dominação definitiva da coisa pública para fins privados e partidários. Talvez, quando nos dermos conta dos efeitos nefastos da nossa conivência inerte e passiva, já seja tarde para lutarmos pelos direitos da liberdade. Até ela – liberdade – já vai ter sido roubada.