domingo, 29 de julho de 2007

GESTÃO DE CRISE DE IMAGEM OU DE PROTEÇÃO DE CRIMINOSOS?


por Paulo Moura, cientista político



Um dos negócios mais lucrativos no ramo da comunicação e do marketing hoje em dia é o da gestão de crises de imagem. O ramo é novo no Brasil, mas promissor, notadamente junto a duas clientelas em especial: políticos governistas e companhias aéreas.Um dos mais destacados profissionais do setor é o jornalista Mário Rosa, que já trabalhou com Duda Mendonça. Quem tiver interesse em se aprofundar no assunto pode ouvir os comentários de Rosa sobre o tema na rádio BandNews. Mas, especialmente, deve ler "A era do Escândalo" e "A reputação da velocidade do pensamento", ambos da Geração Editorial, nos quais o jornalista descreve casos específicos e recentes de gestão de crises de imagem pública de pessoas e empresas, e aborda a problemática da gestão da imagem/reputação numa sociedade midiática e globalizada com as características da atual.


O governo Lula incorporou essa tecnologia ao seu arsenal de manipulação da opinião pública, tudo indica, a partir do escândalo do mensalão, tendo obtido surpreendente sucesso ao proteger Lula do escândalo e possibilitar a recuperação da imagem do governo após o caso. A reeleição do chefe do governo mais corrupto da história do Brasil é case internacional em qualquer congresso da área. Ao observador atento, certamente não terá escapado a percepção de que técnicas apuradas de manipulação da opinião pública, nos casos dos acidentes da GOL e da TAM, e do apagão aéreo em geral, estão sendo postas a serviço da impunidade do réu número e seus principais cúmplices nesses crimes. Aliás, curiosamente, o primeiro caso citado por Rosa em "A era do escândalo", é o da gestão da imagem da TAM no acidente com o vôo 402, no qual, em 31 de outubro de 1996, 99 passageiros morreram na queda de um Focker 100 nas cercanias do aeroporto de Congonhas.Recomendam os manuais, que, em casos como esses, deve ser montado um enxuto, flexível e ágil "Comitê de Gerenciamento de Crises" (CGC). Composto por cerca de oito integrantes apenas, o CGC recebe a incumbência de analisar situações e administrar respostas eficazes para evitar ou minimizar danos à imagem do cliente. Inúmeras táticas informação e contra-informação, assim como técnicas de manipulação de dados e modelos informáticos de projeção de cenários foram desenvolvidos pelos especialistas e postos à disposição de pessoas, empresas e governos envolvidos em crises de imagem.A sofisticação das formas de manipulação de dados e informações numa sociedade imersa em inúmeros canais de comunicação multidirecionais e multidimensionais, através dos quais os indivíduos são bombardeados diariamente por uma profusão enorme de informações, torna cada vez mais difícil saber-se o que realmente está por trás das versões dos fatos noticiados pelos meios de comunicação.Um recurso visivelmente em uso pelo governo no caso dos acidentes da GOL e da TAM, por exemplo, é o mascaramento da fonte emissora.


O mix básico do processo de comunicação pressupõe a existência de um emissor; um ou mais canais de difusão; a mensagem, e, finalmente, o receptor. Em cada um desses componentes do processo de comunicação, ou em mais de um deles simultaneamente, é possível interferir com técnicas de manipulação cujo objetivo é camuflar o verdadeiro emissor de uma mensagem. O uso de múltiplos canais para difusão de mensagens alternativas ou contraditórias para testar reações ou semear confusão e conflito entre os receptores, também é um recurso em uso pelo governo. Aliás, foi por isso que Lula, covardemente, desapareceu da mídia nos dias imediatamente subseqüentes ao acidente da TAM. Seu CGC precisava de tempo para pensar nas versões, difundi-las e testá-las, de forma a permitir o responsável número um pela crise aérea e pelos acidentes somente viesse à publico quando a confusão estivesse semeada e o script de suas falas e aparições públicas estivesse elaborado e planejado.


]Uma garimpagem atenta do noticiário sobre os dois acidentes aéreos permitirá listar-se dezenas de explicações contraditórias para cada um deles, todas revestidas de linguajar "técnico", supostamente vazadas para a imprensa a partir de "relatórios oficiais e sigilosos" a que "nosso competente jornalista teve acesso" para produzir o furo de reportagem do veículo. Ou ainda, plantadas na mídia por especialistas-spindoctors, especulando sobre possíveis explicações, todas elas coerentes, mas nunca fundamentadas em provas efetivas que existem, mas nunca são divulgadas. Através desses expedientes, o emissor abastece líderes de opinião de versões confusas e conflitantes sobre o fato, de forma a impedir a formação de uma onda unificada de opinião pública contra o emissor. O que causou o acidente com o Boeing da GOL? Falha dos controladores de vôo? Falha dos pilotos da GOL? Falha dos pilotos americanos? Falha no sistema de radares? A explosão do Boeing? Falha do sistema de comunicação? Blá, blá, blá ... Passaram-se dez meses do acidente, a caixa preta foi decodificada, o Ministério Público, a Polícia Federal, a CPI do Congresso e técnicos do governo foram acionados para investigar as causas e identificar os responsáveis. Mas a verdade nos é sonegada e os verdadeiros criminosos seguem impunes.


Quem causou o acidente da TAM? A falha de projeto do Airbus que colocou o manete da rebimoca da parafuseta do reverso da turbina esquerda que entrou em funcionamento oposto ao do procedimento devido? Falha do piloto? Falha de manutenção da TAM? Água na pista? Excesso de combustível no tanque do avião, causando sobrepeso na aeronave? A autorização para pouso de aviões do porte do Airbus num aeroporto que não comporta aviões desse tamanho? A falta de grooving (palavrinha mágica plantada na imprensa para alimentar as falas de gente que gosta de bancar especialista em certos círculos sociais) na pista? A pressão das gananciosas companhias aéreas impedindo o fechamento da pista num mês de grande demanda de passageiros? O hotel que Marta Suplicy teria autorizado construir nas cercanias do aeroporto, provocando a redução da pista? E blá, blá, blá ...; lá se vão mais criminosos impunes.


No caso em questão, dado que o governo e a TAM montaram seus gabinetes de crise e travam uma luta para se safarem dos prejuízos às suas respectivas imagens, bolsos e poderes, o cenário tende a ficar mais confuso devido à possibilidade de que táticas como essas estejam sendo usadas simultaneamente pelos dois responsáveis solidários pelo acidente. Contribui para agravar a situação, a volúpia de parlamentares; técnicos; especialistas; comentarias políticos e outros palpiteiros em busca de quinze minutos de fama ou de propaganda política gratuita, ou ainda, de veículos de comunicação em busca de manchetes bombásticas, leitores e audiência. Parece complicado? Pois, graças à difusão viral de informações e as características de hipersegmentação; multidirecionalidade e multimensionalidade das trocas de mensagens que a internet possibilita e induz, as coisas se complicam ainda mais, já que o poder de semear confusão dilui-se pelos terminais de computador de uma infinidade incalculável de emissores/receptores, levando o processo a um crescente nível de abstração e complexidade de difícil decodificação.


Um excelente artifício para buscar a verdade por trás dessas sofisticadas técnicas, nesse caso, empregadas para mentir e proteger criminosos; é recorrer às conhecidas perguntas que os policiais se fazem no início de investigações de crimes em que as provas e evidências estão bem ocultas.A quem interessa esconder a verdade sobre o crime?Ao governo, e dentro dele, à cadeia de responsáveis diretos e indiretos, todos comandados pelo presidente da República.


E, às companhias aéreas, conforme comprovado pelo tratamento dispensado aos passageiros nos procedimentos de gestão das atividades que a elas compete na prestação de serviços de transporte aéreo.O que ganham os beneficiados com a ocultação das provas e evidências do crime?A preservação de suas imagens públicas; a sobrevivência no poder; dinheiro sujo de sangue, e, principalmente, a impunidade pelos crimes cometidos.